terça-feira, 27 de maio de 2008

Palavras ao Vento

Impressionante como se é fácil impressionar com simples idéias e bonitas palavras. Qualquer razoável prestidigitador gramatical é capaz de iludir o público com palavras bem apessoadas e fingir-se intelectual, mascarando seu conteúdo com uma boa embalagem.

Eis o exemplo: um moleque saído do berço e que já se supõe escritor, enquanto quem o lê, com seus preciosismos, sarcasmos e piadinhas fúteis, já o supõe bom escritor.

“É preciso pintar bem o medíocre”, Gustave Flaubert.

“Com bons sentimentos, faz-se má literatura”, André Gide.

Por mais que tente começar algo de conteúdo, vejo-me eternamente enfrentando minha “patricinha interior”, remetendo-me à banalidade habitual. Comecei então a divagar sobre o poder da palavra e do palavrão.

A primeira, uma donzela indefesa, subordinada aos insensíveis que dela fazem uso, com ou sem destreza, freqüentemente exerce sua soberania feminina sobre seu macho, o palavrão. A tal senhora, não se sabe em que momento histórico, passou a subjugar o então másculo e viril palavrão aos seus encantos. Este, como é próprio a todo homem, se subordinou aos encantos da amável fêmea, tornando-se mera “palavra de baixo calão”, alcunha que lhe rebaixou à categoria de obsceno, imoral, impróprio (não que este autor tenha qualquer objeção a tais adjetivos que tão raramente lhe são endereçados).

Teria o primeiro humano pré-histórico inicialmente dito uma palavra, apontando aos seus semelhantes determinada coisa, nomeando-a, ou teria ele primeiro dito um palavrão, como reflexo ao se machucar tentando descobrir a função daquela “coisa”? Ó vã filosofia, onde estão as respostas para tantas perguntas que me afligem a alma? Como seguir a vida, agora que tenho tais dúvidas em minha mente?

Indago, finalmente, o porquê dessa afeição peculiar dos que se dizem “cultos” pelo uso da palavra, em detrimento do palavrão; sendo a tal figura feminina uma dissimulada, em razão do uso que dela fazemos, e o macho em questão, a mais sincera expressão do pensamento, vez que não se permite ao desfrute de os usuários alterarem-lhe o significado.

Abaixo, deguste (!) um texto, muitíssimo criativo, que me chegou como de autoria de Millôr Fernandes. Na internet, nunca se sabe.

“O Direito ao Foda-se”


E aqui, um breve resumo sobre o palavrão e seus usos.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Rogai por Nós Pecadores

Venho humildemente inserir-vos (sem maldade) a respeito da descoberta recente da diferença entre dois vocábulos semelhantes, até então para mim sinônimos: farrar e farrear.

Vale ressaltar que a distinção se faz presente apenas em determinadas regiões do Nordeste brasileiro, não sendo encontrada em minhas andanças pela Paraíba, tampouco deve ser unânime dentre os nativos donde foi experimentada.

Derivado do latim farririum (de acordo com minha pouca criatividade), o verbo "farrear" trata de uma diversidade (ou seqüência) de atos, quais sejam, da degustação de iguarias etílicas, da manifestação de alegria e prática do flerte - beber, curtir, raparigar. Da conjugação "eu farreio, tu farreias, nós farreamos", supõe-se que os sujeitos em questão estão a desenvolver o processo também conhecido por ócio produtivo, expressando descontração e sociabilidade com outros membros da mesma espécie.

Igualmente pertencente ao vocabulário latino, o verbo "farrar", originalmente responsável pelas mesmas práticas anteriormente descritas, recentemente observamos tratar-se do ato típico de adoração ao deus Baco, praticado por membros escusos aos preceitos morais existentes, escória indecente, adepta de um estilo de vida boêmio e moralmente questionável, que por nobre causa própria se dedica à arte do que "está na fantasia dos infelizes, no dia-a-dia das meretrizes".

Em suma, dedicar-nos-emos a árduos estudos detalhados e empíricos de tais verbos, uma vez que não adquirimos conhecimento suficiente para publicar um tratado científico respeitável.

A primeira Vez

A gente nunca esquece mesmo... Mas desta vez não serei indecente.

Esta foi minha primeira reportagem, para o site Repórter Junino, da faculdade de Comunicação, UEPB.

Descobri também, no mesmo dia, que como entrevistador sou um ótimo estudante... Publico, então, apenas a matéria original, sem edição.

Leia aqui a matéria publicada.

XXX Congresso Nacional de Violeiros marca o início do calendário cultural campinense.

Sexta (16) e Sábado (17) foram dias de glória para a Arte do Repente. Após três anos ausente no cenário campinense, o XXX Congresso Nacional de Violeiros, realizado no Teatro Municipal Severino Cabral e organizado pela Associação de Repentistas e Poetas Nordestinos (ARPN) deu uma bela demonstração da força da cultura popular nordestina. Na ocasião houve a gravação de um DVD que irá resgatar e reaproximar o público dos tempos áureos dessa arte.

A complexa arte do improviso, cuja origem remonta aos trovadores medievais, foi representada com orgulho por 16 repentistas de renome nacional e internacional, tais quais Ivanildo Vila Nova, eleito Cantador do Século XX e co-autor da célebre canção “Nordeste Independente” em parceria com Bráulio Tavares; e Geraldo Amâncio, violeiro e apresentador do programa cearense “Ao Som da Viola”; além da presença de poetas declamadores como Zé Laurentino, autor do poema “Matuto no Futebol” e Chico Pedrosa, autor de “Briga na Procissão”.

Sextilha, décima, martelo, galope, gemedeira, quadrão... São métricas de uma arte pouco divulgada pela grande mídia, mas exibidas com técnica e emoção pelos grandes maestros da viola.

De acordo com depoimentos do público e dos próprios repentistas, o primeiro congresso, realizado em 1974, contou com o apoio em massa dos estudantes, numa época de efervescência cultural onde Campina Grande era vista no cenário nacional como capital do repente devido ao seu pioneirismo. O poeta Zé Laurentino cita a grande quantidade de espectadores que assistiram ao espetáculo de pé, por falta de assentos.

Após essa época de glória, o repente perdeu espaço na mídia e foi sobrevivendo em pequenos círculos fechados de cantadores que passaram a tradição adiante, observando-se nos últimos anos um leve crescimento da valorização desta arte genuinamente nordestina. Desde muito tempo, tradicionalmente no São João de Campina Grande, segundo o mesmo poeta, arranjam para o repente um lugarzinho como “prêmio de consolação para não dizer que não falei das flores”.

Segundo Maria Aparecida, sócia da Associação dos poetas – Casa do Cantador – e que acompanha de perto o trabalho destes violeiros, “este evento é muito importante porque resgata a nossa cultura e aproxima essa arte do público que acompanha o repente há muitos anos, além da possibilidade de atrair também aqueles que não o conhecem”, porém lamenta que a mídia não dê o valor que estes artistas merecem.

Tendo sido outrora um artista subjugado, visto com desprezo devido à falta de formação educacional e profissional, foi ao longo dos anos profissionalizando a arte, tal qual o poeta e advogado Apolônio Cardoso, que vive unicamente da cantoria. Ainda assim essa arte continua restrita a poucos devido à complexidade e carência de professores e metodologia de ensino, não sendo muitos os que conseguem sobreviver exclusivamente da arte do improviso.

Segundo as palavras do organizador do evento e presidente da Associação de Repentistas, Tião Lima, há uma vontade de se realizar campanhas nas escolas e universidades em busca de re-popularizar a arte do repente e de descobrir novos talentos, como o repentista Raullino Silva, de 27 anos. As dificuldades de organização de um evento desse porte, com cantadores e declamadores famosos vindos de outros estados, se devem principalmente aos obstáculos quanto ao patrocínio e apoio cultural, não havendo mais um público tão grande quanto em outros tempos.

Com muita serenidade os repentistas envolveram a platéia em temas como a morte da menina Isabella Nardoni, bem como com criatividade e humor se digladiaram sob os motes "Você não tem cantoria que cause admiração", com a dupla Raullino Silva e Valdir Teles; e "Cantador do meu nível tem que ser batizado e criado no sertão", pela dupla Severino Feitosa e Zé Viola.

Geraldo Amâncio e Moacir Laurentino, retrucando a idéia de que o repente seja uma arte da qual o público é mero espectador, convocaram o público a participar de uma cantoria, com o tema galope à beira mar. Este momento foi marcado por grande euforia do público, que acompanhava os violeiros a cada refrão.

Fica do evento a saudade, bem como a esperança de um futuro melhor aos cantadores, merecedores do nosso apoio incondicional à cultura popular.

terça-feira, 13 de maio de 2008

À decadência

Os humanos são estranhos, têm cada costume esquisito que comemoram até mesmo a decadência da vida.

Queria saber quem foi o primeiro infeliz a inventar essa comédia melodramática chamada aniversário.

Escutar palavras de carinho regadas a tapinha no ombro e abraços emocionados (estes últimos após alguns litros vazios), depois, ser elogiado por tudo que você já construiu na vida (nada, no caso) e tudo que irá construir (sei, sei).

Saber que se estão esvaindo os melhores dias de sua vida, ou apenas que você está morrendo lentamente sem se dar conta de que não teve melhores dias, e festejar o acontecimento nunca me pareceu interessante.

A seguir, um poeminha publicado num extinto “fotolog”, aos 15 anos – debutante é a senhora sua mãe. Algo que combina com meu próximo fim de semana e não perdeu o sentido ao longo desses últimos cinco anos, quiçá não perderá nos próximos cem.

Soneto do Amor Etílico

Oh senhora da minha alegria
Que prazer te apreciar;
Me provocas fantasias,
Depois me fazes provocar.

Foste sempre companheira
Amiga e confidente;
Ate mesmo na derradeira,
Continuas sempre ardente.

Seja noite ou seja dia
Te desejo toda minha,
Só imploro, não fiques vazia...

Pois no outro dia, cachaça,
Você deixa sua marca...
e vem a maldita ressaca.

Fiz uns ajustes na linguagem apenas pra diminuir a dor na consciência (e na vista) com o palavreado do pseudo-poeteiro em questão. A título de curiosidade, “provocar” no linguajar cearense, que me inspirou na época, significa vomitar.

Finalizando a criação, vinha o clímax:

“Repasse ao maior número de amigos possíveis nos próximos 51 minutos ou São Ânus, protetor dos bêbados sem dono, não terá piedade do seu orifício monossilábico.”

Ano passado comemorei-o numa quarta-feira assistindo ao vivo e em primeira pessoa ao jogo Fluminense x Galinha na Copa do Brasil, ano em que o Flu sagrou-se campeão da Copa. Inesquecível.

Este ano, o dito cujo cai num domingo, permitindo que a comemoração comece desde a sexta-feira, e ainda me dando o orgulho de ver o Campinense ser campeão paraibano em cima da arqui-rival galinha no último jogo do campeonato.

Ah, esses humanos... Inventam cada circo que me sinto obrigado a degustar um (uns) conhaque(s) nos próximos dias e comemorar enquanto há tempo, enquanto há fígado.