sábado, 28 de março de 2009

...Eis a Questão

Não se é meramente aquilo que se vê. Não enxergamos todo esse enquadramento de 180º que diminuirá ao longo do desgaste das retinas, do desgaste da alma, que vai se tornando adulta, triste e solitária, até que aprende a olhar apenas para si mesma.

Será que me vêem como sou ou será que sou como me vêem, exatamente como não quero que vejam? Pareço ser aquilo que sou ou será que sou aquilo que pareço ser, exatamente o que não quero parecer? Nem jogo de palavras é solução, nem a solução me parece estar em palavras.

Não! Por que os outros seriam da forma como os vejo? Assim, de que serviriam os outros sentidos se somente um nos fosse suficiente?

Sei que posso ser o que sempre quis. Mas se nem sempre quis ser aquilo que sou, muito menos sei se o que quero ser será aquilo que um dia quererei.

Duas definições peculiares marcaram o modo de enxergar a mim mesmo. Palavras sinceras e frustrantes, quase humilhantes, adjetivações ofensivas, ditas oportunamente por quem me abriria os olhos. Para alguém habituado ao exercício do esquecer, palavras que souberam, ao seu jeito, ensinar.

A primeira deu-se quando ouvi ser a decepção de quem eu sempre me esforcei em orgulhar, esforço que era em geral insuficiente. Daí a descobrir que o tal clichê realmente ensina a viver custa-me quase uma década e ainda não ensinou pra quê veio de fato; mas abriu um precedente único: vasculhar meus próprios defeitos e descobrir-me, a cada passo, a cada ato.

A segunda? Daqui a uma década espero ter a resposta moldada em meu caráter.

"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
[...]
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
[...]
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta."

sexta-feira, 13 de março de 2009

Indeciso? Talvez

Sempre fui uma pessoa muito decidida. Decidi desde cedo que os outros decidiriam por mim.


Decidi não tomar importantes decisões, não viver grandes aventuras, não amar intensas paixões. Houve sempre quem o fizesse por mim.


A indecisão até que me cai bem: faço planos nunca realizados, durmo sonhos nunca lembrados, choro lágrimas nunca roladas, romantizo amores nunca vividos.


Falho em tudo, peco pelo despropósito, condeno-me voluntariamente a passar pela vida e não viver.


Uma lição de vida: o mundo é um lugar triste. Tenha medo da felicidade, tal qual este que vos fala.


Essa merda parece auto-ajuda.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Homenagem ao Malandro

Eis o malandro.


Nunca soube apreciar o gracejo de um sorriso feminino e suas intenções muito bem escondidas, desvendar o falso desinteresse romântico incrustado na suavidade de um perfume ou o apelo sensual disfarçado num vestidinho decotado que dá contornos inocentes, quase angelicais, àquela tentação de salto-alto.


Qual o sentido dos flertes intermináveis se ao fim da noite os corpos tinham uma só necessidade? Desdenhava de sua falta de tato pisando, quase que sem querer, no coração alheio; tornando-se a cada contradança o diamante lapidado dos cabarés, o messias fajuto dos pagãos, o “barão da ralé” que tanto almejava na infância.


Pensou conseguir enganar a si mesmo, ser imune àquele vírus. Atordoado, talvez fosse tarde para regenerar-se, mas acreditou piamente poder tornar-se um homem honesto, um homem honrado, um homem bom, um homem...


Ah, mas olha lá quem passa! Olha as más intenções por sobre aquele salto-alto, o gracejo nas curvas debaixo do vestidinho curto, a tentação dos cabelos esvoaçando e levemente recaindo sobre o decote...


Eis que surge o malandro outra vez.